17 de Maio de 2006 - 22:26
Outro dia, enquanto me meti a dar umas aulas de literatura, eu e meus "alunos" (por assim dizer...) começamos a abordar uns assuntos interessantes referentes a Poesia.
Não é algo fácil de se tratar... poesia moderna é uma coisa que não tem regras; ou tem! Mas, essencialmente, predomina o "ponto de vista". Se você tem o ponto de vista igual ao meu, fazemos o mesmo "timbre" descritivo. Pode ser que nossas metodologias poéticas sejam diferentes, até.
Conversa vai, conversa vem (e aula nada... mas no fim das contas, foi a melhor aula!), e chegamos no ponto que tratava a beleza estética de uma poesia. É outro assunto difícil de se tratar, porque TAMBÉM depende muito de ponto de vista. Assim como o certo e o errado; assim como o que é pecado e o que não é... É tudo muito relativo, é tudo muito humano. A gente não pode apontar, neste conjunto universo, nada que seja uma verdade natural, nada. Mas, enfim, ousamos discutir beleza, ousamos discutir estética. Ousamos apontar o que "funciona", dentro de uma composição literal (seja letra de música, seja poesia, ou ambos)...
O que acontece é que muitas vezes há muita erudição desnecessária. Há muito enfeite. Várias coisas podem ser ditas de forma simples e obter efeitos surpreendentes, profundos, metafísicos, inexatos! E como não poderia deixar de ser? Inovação lingüística, neologismos... tudo se encontra dentro do padrão moderno... mas nem tudo "funciona". E o que é que "funciona", se tudo depende do "ponto de vista"?
Aí é que está... não existe uma receita de bolo para a escrita, é óbvio. E seria muito clichê dizer que "escrever com sentimento" tornaria sua poesia uma obra mais qualificada do que uma outra que foi escrita de forma menos... ? ...
A gente pode tomar um exemplo. "E os corpos frios e frígidos/mas tórridos, semblante ao sol; homens/tomaram o rumo da partida/o rumo oceânico/o rumo de onde vieram as artes, onde residem os segredos/o Mar intenso e sedutor/ a eloqüência das paixões, a onda-desatino/de onde viemos, e para onde iremos/como um grande ciclo, uma grande espiral/uma grande maré". É notável o uso de atributos até pretensiosamente eruditos, uma linguagem de certa forma refinada e rebuscada...
Agora vamos para uma nova forma de escrever o mesmo tema:
"Minha jangada vai sair, pro mar,
Vou trabalhar,
Meu bem querer,
Se Deus quiser,
Quando eu voltar, do mar
Um peixe bom,
Eu vou trazer,
Meus companheiros também vão voltar,
E a Deus do céu vamos agradecer !"
Percebem como uma escrita simples, até coloquial; o que está escrito não é mais do que o que um pescador; que não tem tanto conhecimento de escrita por primordializar outras virtudes; poderia dizer! E isso toca fundo em qualquer pessoa que perceba o que está sendo dito! Se consegue imaginar o sentimento de tristeza, de coragem, de perda... de saudade, de nostalgia, de ausência... o que ocorre na vida de um pescador...
Mas a gente escreve interpretações literais num outro momento. O importante é que a questão não é escrever a seu "ponto de vista". A questão é conseguir passar algo, fazer alguém que lê, relê ou estuda o que foi escrito, sentir, e não propriamente entender... Por mais complicado que isso seja. É o "olhar' das palavras...
Nenhum comentário:
Postar um comentário